A guerra acabou. O acordo que foi celebrado entre as partes determinou o cessar fogo imediato e a troca de reféns de ambos os lados.
A suspensão das hostilidades, imagine você, coincidiu com a posse do novo presidente do império, justamente a nação que vinha financiando o massacre de pessoas inocentes por mais de um ano. Muito suspeito isso! Ou não. De repente, o novo monarca sinalizou, de antemão, que não seria tão generoso quanto o anterior, situação que teria feito o deus da morte, com toda a sua arrogância, descer do Olimpo e se juntar aos mortais comuns. É notória, pois, a condição desse deus que, com sua fragilidade descarada, depende do império para levar a cabo o seu propósito de eliminar o povo que fora privado, desde sempre, de habitar a sua própria terra.
Coincidências à parte, fato é que agora os sobreviventes podem voltar para as suas casas, ou para o que sobrou delas, normalmente escombros, debaixo dos quais repousa a esperança de uma paz que, depois de tanta angústia, é provável que nem tenha mais importância.
De qualquer forma, faz parte da natureza humana tornar à casa após flagelo qualquer que obrigue a deixar o lugar onde ficaram pertences, lembranças e, neste caso, o sangue dos seus.
Mas o triste cenário que fere a dignidade humana, este sobre o qual discorremos agora, parece não sensibilizar o restante do mundo, que segue seu rumo sem olhar para trás ou para os lados.
Resta agora, a quem foi abençoado com o milagre da sobrevivência, lutar contra a fome, contra o frio e contra as doenças que resultam da miséria e da falta de saneamento.
Também não há hospitais, tampouco remédios. Somente desespero. Chego a pensar que alguns nem festejam a ausência das bombas, uma vez que a tristeza secou seus corações, e minguou o valor à vida. O olhar vazio de cada um reflete isso perfeitamente. É possível até que vejam com desalento o término da guerra, já que nela as chances de uma morte rápida são maiores. Alívio para uma dor que, todos sabemos, não acaba com a trégua.
Aos homens que normalizaram a tristeza, desde já, fora concedido o descanso, tendo em vista a sua estressante atividade de promover a matança de gente inocente. Mas hoje, o champanhe gelado lhes é servido para brindar a tranquilidade e, quem sabe, ajudá-los a elaborar novos planos, nada comprometidos com a paz, logicamente. E, se acaso qualquer lembrança vier bulir com sua consciência nenhuma, certamente um sorriso será notado em suas faces, indício claro de um forte sentimento de missão cumprida, mesmo que o objetivo anunciado para o mundo não tenha sido alcançado.
E porque o inimigo não fora derrotado é que se fez um acordo, já que o pretexto para o assassinato por atacado era justamente derrotar o terrorista que se escondia na sombra de cada pessoa. Claro que o inimigo continua de pé. Morreram somente as sombras.
Mas agora o novo chefe do império andou dizendo por aí que pretende tirar do seu território o que sobrou da população massacrada. De que fala ele, afinal? Acaso tenciona voltar a despejar dinheiro em prol da matança? Provavelmente.
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