Do luto à luta

Envie para um(a) amigo(a) Imprimir Comentar A- A A+

Compartilhe:

Miriam Gimenes

Quando uma mãe permite que o filho vá para uma excursão escolar, a ideia é que a criança aprenda e se divirta ao mesmo tempo. Ainda que haja preocupação – desde o momento do parto, nenhuma mãe está livre de sentir isso –, o mínimo que se espera é que, ao fim do dia, a criança volte cheia de experiências e histórias para contar. Mas, infelizmente, não foi isso que aconteceu com a advogada Alessandra Begalli Zamora, 42, no dia 29 de setembro do ano passado.

Lucas, 10, que morava em Campinas, saiu com outras 125 crianças rumo a Cordeirópolis, no Interior do Estado. Durante o piquenique, ele se engasgou com um pedaço de salsicha. O Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) foi chamado, mas o garoto estava asfixiado, o que ocasionou, de imediato, sua morte cerebral. Dois dias depois, no hospital, ele partiu. “Ele engasgou e faltou prestação de primeiros socorros de forma rápida e adequada”, lamenta Alessandra. Uma simples manobra de desengasgo – ou de Heimlich ­– poderia tê-lo salvado.

Pouco depois da perda do menino, a sua tia e madrinha, a instrumentadora cirúrgica Andrea Zamora Bettiati, criou a página no Facebook Vai Lucas, com o objetivo de contar essa história e conscientizar da importância dos primeiros socorros para evitar que ela se repita. Dois dias depois que a página foi ao ar, mais de 5.000 pessoas passaram a seguí-la e a compartilhar experiências parecidas: algumas que apenas deixaram sequelas e outras que tiveram o fim igual ao de Lucas. Hoje, já reúne mais de 100 mil pessoas. Por notarem que a situação é mais comum do que se imagina, surgiu a ideia de propor a lei – que deve levar o nome dele ­– para que seja obrigatório que as escolas capacitem seus funcionários a realizarem o primeiro atendimento.

“Não é uma briga pessoal contra a escola ou professor. O que queremos é alertar que precisa haver mais preparo. E as crianças não estão desprotegidas não só na escola. Se pensar em um bufê infantil, por exemplo, elas ficam comendo, correndo, pulando... Os monitores de bufês infantis geralmente são adolescentes, não têm essa capacitação. Se acontece algo vai ficar esperando a ambulância chegar?”, questiona a mãe.

Alessandra diz que existe uma lei estadual que exige que profissionais de instituições educacionais tenham curso de primeiros socorros, mas que não está sendo cumprida. A Lei Lucas, que já foi apresentada a mais de 100 municípios de São Paulo, além de apresentar algumas diferenças desta inicial, exige que as escolas que tiverem esta especificação exponham, em um lugar visível, um selo atestando estar de acordo com a legislação. Assim, fica mais fácil para os pais ajudarem a fiscalizar. A intenção é que a determinação chegue a Brasília.

A partida de Lucas, para Alessandra, não pode ter sido em vão. “Estou tentando transformar a minha dor em amor ao próximo. Meu filho, o único que tive, não vai voltar. Mas os filhos de todas as mulheres, de todas nós, precisam ser mais protegidos. O dia em que eu abrir um jornal e ver que uma criança foi salva por conta desta lei, vou poder viver o meu luto em paz.” #vailucas




Diário do Grande ABC. Copyright © 1991- 2024. Todos os direitos reservados