Sobrevivi ao terror

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Vinícius Castelli

A vida por um fio. O pior lado do ser humano, sem dó nem piedade. Pessoas indo e vindo, muitas outras trabalhando, mães com suas crianças, cachorros no parque, pessoas tomando café, táxis na rua. Gente simples. Vidas interrompidas pelo terror. O atentado terrorista em Nova York, nos Estados Unidos, naquela trágica manhã de 11 de setembro de 2001 que o mundo viu exaustivamente pela TV no mesmo dia e por muito tempo depois, ceifou so­nhos, acabou com famílias inteiras e trouxe tristeza, desespero e o pior lado do ser humano.

Dois aviões com tripulação, sequestrados por terroristas islâmicos, se chocaram com as torres do World Trade Center. Entre elas, onde se loca­lizava o Hotel Marriott WTC, conhecido também como terceira torre, estava a brasileira Adriana Maluendas. O local foi totalmente destruído após a queda das duas torres. Ela havia chegado na cidade três dias antes. Na época, com 29 anos, viajou para se preparar para alguns testes de qualificação para sua entrada no mercado de commodities. Alguns minutos depois, uma terceira aeronave foi arremessada contra o Pentágono, perto da Capital, Washington D.C.

Logo que o primeiro avião se chocou com a primeira torre, ela sentiu o tremor, ligou para a recepção, sem sucesso, e decidiu ir ao lobby. A paranaense saiu de seu quarto, no sexto andar, carregando chave e bolsa. Em meio ao desespero das pessoas, Adriana foi empurrada nas escadas, caiu e fraturou duas costelas. Assim que alcançou a rua, viu o caos instalado, no momento em que o segundo avião se chocou com a segunda torre. Testemunhou aço e concreto caindo do céu. E mortes, muitas.

Durante 13 anos, além do medo de sofrer novo atentado, Adriana foi diagnosticada com transtorno de estresse pós-traumático. Agora, até como uma forma de se libertar, ela está prestes a apresentar o livro Além das Explosões. A data do lançamento e a editora ainda estão em negociação. Segundo a autora, a decisão de escrever a obra surgiu no “momento em que me senti forte o suficiente para enfrentar as experiências sofridas no passado”. Isso aconteceu após 13 anos e logo depois da inauguração do Museu Memorial 911, em 2014. “Alguns eventos me ajudaram a ver que era hora de começar a viver novamente.” Ela conta que escrever essas páginas foi bem difícil, pois é a primeira vez que se abre e compartilha todos os traumas sofridos. “Até então não estava preparada. Não me sentia forte o suficiente para encarar e dividir o que passei. Nem mesmo com minha família me abri completamente durante todos estes anos”, diz.

Quando lembra de tudo e tenta expressar o que viu, sentiu e viveu, as palavras ainda fogem. “Sinto profunda tristeza e dor de não conseguir nem mesmo gritar. Estava em estado de choque e petrificada por minutos que pareciam ter se estendido por horas. Lágrimas escorriam pelo meu rosto. Escutei os gritos desesperados de pessoas pedindo por ajuda, pessoas se jogando pela janela abaixo para suas mortes e um cheiro forte e difícil de descrever.” O primeiro contato com sua família, que estava no Brasil, só aconteceu oito horas após o atentado, quando conseguiu encontrar outro hotel para se hospedar. “Ainda estava em estado de choque, machucada, exausta e não me lembrava de nenhum número de telefone, nem mesmo de minha casa”, diz ela.

Adriana passou por tratamentos médicos, se reergueu e hoje tem sua vida retomada. Adotou Nova York como sua casa. Aos 45 anos, trabalha com turismo e ainda se entristece quando fica sabendo de atentados terroristas. Ela acredita que nenhum lugar está livre disso. Ainda assim segue otimista, forte e acredita que todos devem se unir para combater ações como a do 11 de setembro, “com respeito ao próximo, senso de confra­ternização e irmandade”, reflete.

Mesmo com tanto relato de horror, de coisas que, assim como Adriana, tantas outras pessoas viveram naquele momento, e vivem até hoje em vários lugares do planeta, a sugestão da autora com a obra é para trazer o bem, transformar a experiência que passou em mensagem de esperança. “Quero encorajar aqueles que, como eu, enfrentaram dificuldades extremas, depressão, traumas ou perdas em suas vidas. Tudo para motivar e ajudar a perseverar, a nunca abandonar suas metas e jamais desistir da vida”, explica. “Escrevi este livro na esperança de que os leitores vejam que coisas horríveis acontecem, mas, enquanto houver suspiro, haverá esperança para um futuro melhor, um futuro impulsionado pelo próximo. Toda vez que viramos uma esquina, abrimos uma porta ou cruzamos uma rua, lá está ele, nos esperando. Nada será como antes e a dor vai passar.”




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